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Arquitetos: GRX Arquitectos
- Ano: 2019
Descrição enviada pela equipe de projeto. Durante décadas, a arquitetura viveu preocupada com a cidade, suas transformações e seu futuro, mas o futuro pode estar não na cidade, mas na zona rural, diante do colapso climático e político que estamos vivendo. A Casa Calixto nos permite refletir sobre a possibilidade que os contextos rurais oferecem na criação de novas realidades biopolíticas.
A casa está localizada em Puebla de Don Fadrique, em uma encruzilhada geográfica entre Castilla La Mancha, Múrcia e Andaluzia, no sopé de um dos picos mais altos do sul da Península Ibérica, La Sagra. Esta localização sujeita o projeto a condições climáticas muito particulares, mais próximas de um clima continental do que Mediterrâneo.
Com tradições profundamente enraizadas, Puebla de Don Fadrique se depara com o dilema da modernização e do respeito à sua própria paisagem e cultura. Nesse dilema, as margens da cidade e as novas áreas de expansão desempenham papel fundamental, tornando-se os locais de transformação de sua paisagem. Bernard Rudofsky, em suas viagens pela Península Ibérica, documentou a maneira como as cidades foram construídas em harmonia material e paisagística com o meio ambiente. Esse processo ocorreu devido à transformação de materiais da terra em arquitetura, mas os vícios nas metodologias contemporâneas de construção (através da influência do capitalismo nos processos de fabricação) destruíram a identidade da construção vernácula, bem como a identificação dos habitantes com o seu entorno.
A casa assume a difícil tarefa de dar continuidade à paisagem vernacular por meio de uma construção contemporânea, onde o arquiteto se apresenta como facilitador de alternativas paisagísticas e cujos resultados devem apresentar materialidades de resistência.
Desse ponto de vista, a estrutura da casa é feita de concreto, o que permite trabalhar com as construtoras locais e possibilita um resultado orgânico, imperfeito e artesanal. O revestimento é feito com alvenaria de pedra de uma pedreira local usada como matéria-prima para cascalho. Esta pedra é o resultado do material excedente na produção de grandes lajes, o que a torna muito econômica e cujo resultado está relacionado às construções vernaculares da região, presentes no imaginário local. Do mesmo modo, a própria natureza material da pedra requer uma construção manual que lhe dê força e integração com a paisagem.
A casa é articulada com um programa simples, uma garagem bem conectada ao jardim para poder receber os amigos e ambientes bem ensolarados nos quais as grandes aberturas permitem a vista da paisagem mas, ao mesmo tempo, possibilitam o controle da entrada da luz solar no verão. O projeto baseia-se na lógica dos percursos pela casa, como um promenade architecturale, bem como em sua conexão com a paisagem e o jardim. Uma parede perimetral que, em continuidade com a paisagem local, gera diferenças de elevação, permite estabelecer um duplo diálogo: observar a paisagem desde dentro e preservar a intimidade dos olhares externos. A transição entre o interior e o exterior é materializada a partir de uma abertura horizontal, voltada para o jardim, e duas verticais. Caminhando pela casa, pequenas aberturas conectam o mundo doméstico à paisagem externa. O jardim é entendido como um intermediário da paisagem através de uma nova topografia. Caminhar pelo jardim nos permite um jogo de olhares ao meio ambiente.
A casa é apresentada, nos termos de Gilles Clement, como uma "terceira paisagem" onde a natureza assume a arquitetura. O jardim se apropria do vazio entre as pedras e a passagem do tempo é uma aliada, como a vegetação faz nas pedras de um rio. A Casa Calixto inverte os padrões da arquitetura moderna: a arquitetura não tenta dominar o ambiente, mas se tornar o ambiente. Dessa forma, os muros não são protegidos da natureza, apenas da cidade, gerando um refúgio da paisagem, um “jardim em movimento”.